Pesquisadores de diferentes países, moradores locais, bombeiros e um escalador estavam à procura da árvore mais alta da Amazônia brasileira já registrada.
Percorreram 220 quilômetros de barco e caminharam 10 quilômetros mata adentro até encontrarem um exemplar espécie Dinizia excelsa, também conhecida como Angelim Vermelho, dentro de uma unidade de conservação estadual de uso sustentável, a Floresta Estadual do Parú, no Pará.
A árvore tem 88 metros de altura – algo equivalente a um prédio de 24 andares. Sua altura é um recorde para a Amazônia brasileira, que ainda não tinha registrado nenhuma árvore com mais de 70 metros de altura.
A descoberta da equipe coordenada pelo professor Eric Bastos Gorgens, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), virou artigo na publicação acadêmica Frontiers in Ecology and the Environment, uma das mais conceituadas revistas de ecologia do mundo.
A "gigante" da Amazônia estava intacta, bem longe dos focos de incêndios que alastraram por outras partes da floresta.
"O risco (de queimada) é praticamente zero. A região é muito remota, distante de qualquer concentração humana, a mais próxima está a 220 quilômetros", explica o professor da UFVJM. Ele coordenou a expedição, que contou também com pesquisadores das universidades de Oxford, Cambridge, Federal de Alagoas, Instituto Federal do Amapá, e Estadual do Amapá.
"Além disso, a árvore está numa região cercada por dois grandes afluentes do Amazonas, os rios Parú e Jari. Devido ao difícil acesso, a região não é visada por madeireiros, agropecuaristas, nem garimpeiros". "Até o momento", pondera o professor.
O exemplar da espécie Dinizia excelsa localizado pela equipe de Gorgens não é a única árvore gigante, apesar de ser a mais alta já registrada na Amazônia brasileira.
Sete áreas de 'árvores gigantes'
Antes de encarar a viagem pelo rio Jari, pesquisadores de universidades do Brasil, Finlândia e Reino Unido já tinham analisado dados de 594 coleções de árvores espalhadas por toda a Amazônia brasileira.
Usando uma espécie de "radar laser" que faz sensoriamento remoto, os pesquisadores identificaram sete regiões com árvores gigantes, todas com altura superior a 80 metros.
"O que é extraordinário para a Amazônia brasileira, visto que não havia registros de árvores acima de 70 metros", diz o coordenador do projeto.
Seis dessas coleções estavam região do Rio Jari, entre os estados do Amapá e Pará, incluindo a gingante mor.
Para validar as informações obtidas pelo sensor remoto, a expedição Jari-Paru partiu da cidade de Laranjal do Jari, no Amapá.
Entre os dias 14 e 24 de agosto, as 30 pessoas da equipe se dividiram em quatro barcos para subir e descer o rio, enfrentando corredeiras e cachoeiras.
"A região do Jari é uma das regiões mais isoladas da Amazônia e o único contato da expedição com a civilização se dava por equipamentos SPOTs, um rastreador e comunicador por satélite para situações de emergência", conta o professor.
Localizaram outros exemplares de Argelim Vermelho, com diâmetros que variam de dois a três metros, espécie valorizada no mercado de madeira. A equipe escalou árvores para coletar material botânico e validar a altura. "Foram utilizadas técnicas que não machucam a árvore", explica o professor da UFVJM.
Por que a descoberta é importante?
Para o professor Eric Gorgens, a descoberta da árvore mais alta da Amazônia brasileira é uma prova de como ainda se conhece pouco sobre a floresta e mostra a importância da preservação."Toda vez que a ciência encontra algo nunca antes imaginado, acende um alerta voltado para a preservação. Imagina a quantidade de plantas, animais, insetos entre outras coisas que ainda estão para ser descobertos", afirma.
"As nossas florestas possuem uma riqueza já conhecida que ninguém discute, mas ainda reservam segredos que levam tempo e dedicação para sua descoberta. A exploração não planejada, sem a adoção de práticas sustentáveis, voltado somente para a produção, compromete a manutenção dos nossos recursos naturais", avalia.
Gorgens classifica a existência de uma árvore de 88 metros de altura como "extraordinária" para a Amazônia brasileira. O professor diz ainda que crescer em altura é um desafio para as árvores.
"As árvores altas são mais propensas à quebra e à queda, seja por vento, ou seja por não aguentar o próprio peso. As rajadas causam um torque na base da árvore, levando o fuste à um alto estresse. Outro fator que limita o crescimento em altura é o suprimento de água para copa. À medida que as árvores se tornam mais altas, o aumento da resistência hidráulica e o peso da coluna de água aumenta o estresse hídrico".
Por isso, diz ele, árvores gigantes são consideradas um evento raro.
O engenheiro florestal Matheus Nunes, da Universidade de Helsinque, na Finlândia, destaca a importância da descoberta e da existência das árvores gigantes para o ecossistema.
Além de afirmar que esses raros exemplares da flora são um laboratório natural para conhecer como elas chegaram a tais alturas, elas têm um papel fundamental no ciclo do carbono. "Pois elas têm maior biomassa e, portanto, são capazes de sequestrar mais carbono", explica.
Nunes identificou a árvore tropical mais alta do mundo na Malásia em 2015, quando encontrou dois exemplares do gênero Shorea, uma com 90,6 metros e a outra 89,5 metros.
Ambas superaram o recorde mundial de 2007, quando norte-americanos encontraram, numa outra região da Malásia, uma árvore de pouco mais de 88 metros - que, até a descoberta do pesquisador brasileiro, em agosto de 2015, era considerada a árvore mais alta dos trópicos.
"A derrubada de tais árvores iria na contramão de várias discussões sobre sequestro de carbono para desacelerar as mudanças climáticas e devem ser definitivamente levadas como estratégias para conservação das florestas na região", completa Nunes, que não participou da expedição, mas ajudou a rastrear a Amazônia brasileira em busca de gigantes.
O próximo para grupo é entender o que levou essas árvores a atingirem alturas tão elevadas na Amazônia, tanto do ponto de vista ambiental, quanto do ponto de vista fisiológico.
Eric Gorgens diz que estudos como esse levam muito tempo. "Por isso, é essencial valorizar as unidades de conservação e estabelecer políticas públicas de longo prazo de incentivo à pesquisa e monitoramento de nossa flora", avalia.